domingo, 20 de janeiro de 2013


POEMA DE NATAL

Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.

(Vinicius de Moraes)






A ARTE COMO INSTRUMENTO PSICOTERAPÊUTICO


Jucimara Gonçalves Bernardo


De acordo com Valladares (2006), através do recurso expressivo é possível resgatar o potencial criativo do sujeito, buscando ampliar o conhecimento de si e dos outros, aumentar a autoestima, e principalmente fazer com que, a partir da estimulação e desenvolvimento de recursos físicos, cognitivos e emocionais, o sujeito consiga lidar melhor com os seus sintomas e stress. Frente a isso, o autor supracitado acrescenta que é necessário:



[...] construir um cuidado que envolva um espaço acolhedor, mas não ameaçador e que permita à pessoa [...] expor seus sentimentos, comunicar-se com maior naturalidade e dar conta da complexidade e da amplitude de suas potencialidades. [...] elaborar estratégias e práticas terapêuticas para facilitar a comunicação, mesmo as não-verbais (plásticas), mas que sejam audíveis de alguma forma é uma necessidade humana (VALLADARES, 2006, p.4).


Neste sentido, podemos inferir que a arteterapia permite ao sujeito expressar de modo singular: (1) os aspectos psicossociais (a forma como percebe o mundo e se relaciona com ele); e (2) os aspectos funcionais do seu estado mental. O que possivelmente permitirá ao terapeuta avaliar no primeiro momento as funções primárias: sensação, percepção, atenção, pensamento e linguagem e no segundo momento investigar as sensações vivenciadas após a arte produzida (VALLADARES, 2006).
Para Philippini (2004 apud VALLADARES, 2006, p.4), “a arteterapia é um processo terapêutico com predominância do não-verbal, que permite a transformação com o uso de materiais expressivos, possibilitando a emergência de conteúdos inconscientes para confronto, elaboração e expansão do indivíduo”. Destarte, a arteterapia pode ser caracterizada como sendo, um recurso que tem como principal objetivo estimular o paciente a expressar de forma espontânea sentimentos e atitudes até então desconhecidos.
Em suma, é bem real a ideia de que a arte quando responsavelmente aplicada em processos facilitadores de crescimento, possibilitam a transgressão de si mesmo. 


REFERENCIAS


VALLADARES, A.C.A. Arteterapia, doente mental e família: um cuidado integrado e possível em saúde mental na nossa atualidade? Revista Arteterapia: imagens da transformação. RJ. Clínica Pomar, V.12, nº 12, p.9-32, 2006c.


quinta-feira, 10 de janeiro de 2013




A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR NO  AMBIENTE HOSPITALAR


O tratamento do câncer infantil demanda um tempo considerável de hospitalização, no qual a criança é submetida a procedimentos invasivos e dolorosos, como é o caso da quimioterapia e seus efeitos colaterais. 
Ao pensar em ações que possam minimizar tal sofrimento, Chiattone (2003) ressalta que o brincar é um rico instrumento preventivo, diagnóstico, prognóstico e terapêutico para as crianças na situação de adoecimento e iminência da morte. Pois é através do brincar que a criança consegue formular e assimilar sua  experiência, bem como facilita a internalização, amadurecimento e elaboração do processo de adoecimento.  
A criança acometida por câncer, sofre muito mais com a restrição do seu existir, do que mesmo com a própria doença. Porém, é graças ao seu desejo constante de des-cobrir (presente durante todo o seu desenvolvimento), que a restrição poderá passar a ocupar um espaço menor. Destarte, é quando seu foco de atenção estiver mais voltado para a des-coberta das coisas novas, que a limitação imposta pela doença e pelo tratamento passará momentaneamente a não mais impedi-la de continuar sua trajetória.
Neste sentido, o brincar pode ser considerado um mediador entre a criança e o psicólogo, que se utilizará de tal método para fazer com a criança possa explorar e descobrir novas maneiras de vir-a-ser na situação de doença. Bem como, fortalecer a auto-estima, o autoconceito e favorecer o seu equilíbrio psíquico da criança. Segundo Chiattone (2003, s/p):


O objetivo é ajudar a criança a tomar consciência de si mesma, de sua existência no mundo e de sua situação de doença e iminência de morte, reconstruindo seu senso de eu, fortalecendo suas funções de contato e renovando o contato com seus sentidos e sentimentos. Ao fazer isso, pode-se redirigir a criança para a percepção mais saudável das funções de contato que lhe restam e em direção a comportamentos mais satisfatórios.


Existem diversas técnicas específicas que podem ser utilizadas e incluídas nas atividades do ambiente hospitalar e que ajudam a criança a expressar seus sentimentos. Dentre elas: desenho livre, pintura livre a dedo, pintura de modelos prontos, desenho de polaridades, manuais sobre a doença e hospitalização, recortes e colagens, modelagem, desafios, histórias coletivas, completar sentenças, fantoches e teatros de fantoches, dramatização, árvore da vida etc (CHIATTONE, 2003).
Assim a tarefa do profissional de saúde mental no atendimento a criança terminal consiste em apontar caminhos, oferecer condições de forma direta, sem ser invasivo, sendo leve e delicado sem ser passivo, enfim aceitando a criança com respeito e consideração a sua forma de ser e existir.
Frente a isso, Lione (2001, s/p) ressalta que:


Para a criança em geral e, em especial, para crianças com câncer, é importante que o adulto que delas cuida antecipe situações ou significados para além do imediato, reconhecendo suas necessidades e, ao mesmo tempo, dando-lhes apoio e encorajando-as a enfrentar o que está por vir. Na sua proximidade, o adulto pode antecipar o que vai acontecer no futuro, oferecendo para a criança algum tipo de “confiança” de que ela poderá se lançar ao desconhecido.


As necessidades e as solicitações da criança podem ser facilmente percebidas pelo olhar cuidadoso do adulto que está próximo da criança no seu dia-a-dia.
A confiança surge através do relacionamento cuidadoso, humanizado e respeitoso. Se para a criança a presença do adulto que é marcada pelo apoio e confiança é importante, para o adulto essa relação também é muito valiosa. Pois à medida que o adulto cuida da criança, ele está cuidando também da sua aflição e preocupação em relação à criança, ou seja, ele está cuidando também de sim mesmo.
Existe na verdade uma relação de ser-com-o-outro, onde o cuidado que é oferecido pelo adulto é recompensado pela confiança que a criança deposita no mesmo e que o presenteia com mais força para continuar a superar as adversidades. 


REFERÊNCIAS

LIONE, Fernanda Rizzo di. A criança existindo com câncer. Revista da Associação Brasileira de Daseinsanalyse. Número 10, 2001, São Paulo.

CHIATTONE, H.B.C. A criança e a morte. A psicologia entrou no hospital. 2ªed. São Paulo: Pioneira, 1999.