Jucimara Gonçalves Bernardo
INTRODUÇÃO
Iniciemos então, este texto refletindo primeiramente e não por acaso, acerca dos seguintes questionamentos: o que é a vida? O que é viver? O que é
existir? Viver difere de existir ou ambas são a mesma coisa? Qual o real
sentido de nossa existência? Quando e como morreremos? O que é a morte? É
difícil responder não é? Existem inúmeras explicações a serem dadas, porém é
necessário esclarecer que este não será foco deste trabalho.
Todos esses questionamentos têm por objetivo neste primeiro momento, deixar
claro que é por esta difícil e delicada condição de estar no mundo (vida, bem mais
precioso que possa existir), que o consulente busca o profissional da saúde nas
clínicas e hospitais, clamando e pedindo que o ajude a preservá-la, salvar ou
simplesmente zelar por sua vida.
E assim vos pergunto novamente: como este profissional tem cuidado e
protegido esta vida? Estão cuidado da doença ou do ser humano que sofre? Estão de
fato percebendo o quão frágil se encontra este consulente que beira a eminência de
sua morte? Estão desenvolvendo uma relação consulente/profissional saudável e um
tratamento humanizado?
É em torno desta temática e a partir do filme: Um golpe do destino, que procurarei
discutir a respeito de algumas problemáticas ocorridas no âmbito dos serviços
de saúde.
O TRATAMENTO HUMANIZADO
Ao ser internado o consulente passa por um processo que podemos chamar de
despersonalização, ou seja, passa a receber tratamentos impessoais, como por
exemplo, deixa de ser chamado pelo nome e passa a ser chamado por um número (“o
paciente nº. 37” ),
sua vaidade, seus gostos, desejos, necessidades emocionais e psíquicas passam a
ser grosseiramente reprimidas.
Na conduta de alguns médicos, assim como mostra o filme: Um golpe do destino é nítido perceber
que: a princípio a visão de homem que se tem é inteiramente dicotômica, o foco
principal é a doença e não o ser humano que sofre, alguns se sentem onipotentes
e tratam seus pacientes como máquinas que precisam de um concerto mecânico. Os
aspectos psíquicos e emocionais, assim como a estrutura de personalidade e a
história de vida do paciente são totalmente desprezadas diante da oferta
terapêutica aplicada. Enfim são cenas que na realidade desvelam a desumana
forma de atendimento e procedimentos invasivos desempenhados por estes
profissionais. Mas felizmente, reconheço que não são todos os profissionais da saúde que são assim, existe profissionais qualificados e humanizados em muitas instituições de saúde!
De acordo com Carvalho, Santana & Santana (2009), a temática
humanização e qualidade dos serviços começou a ser discutida no ano de 2000, a partir da XI
Conferência Nacional de Saúde que teve como tema: Efetivando o SUS: Acesso,
Qualidade e Humanização na Atenção à saúde com Controle Social.
Segundo o Ministério da Saúde, humanizar não significa apenas reorganizar
os espaços sanitários, visa, sobretudo, reorganizar os processos de trabalho,
formar e qualificar trabalhadores, garantir os direitos e a cidadania dos
usuários por meio do controle e da participação popular.
Deslandes (2004) apud Carvalho, Santana & Santana (2009), desvela
quatro eixos referentes à Política Nacional de Humanização da Assistência
Hospitalar:
1) Humanização como
oposição à violência, podendo esta ser física (maus-tratos) ou psicológica (a
não compreensão das demandas e expectativas do paciente);
2) Humanização como
capacidade de oferecer um atendimento de qualidade (exemplificada pela
tecnologia leve, a qual diz respeito aos modos relacionais de agir na produção
dos atos de saúde, ou seja, a produção de vínculos, acolhimentos e
autonomização ao usuário);
3) Humanização como
melhoria das condições de trabalho do cuidador;
4) Humanização como
ampliação do processo comunicacional, ou seja, a presença de mecanismos que
permitam a livre expressão dos usuários: a ouvidoria.
Desta forma, percebe-se que, em se tratando do ambiente hospitalar, humanizar
significa compreender também os medos, angústias e incertezas do paciente,
dando-lhes apoio e atenção permanente.
Outra importante missão do profissional de saúde, é estabelecer e assumir
uma postura ética de respeito ao individuo, tratá-lo com dignidade, sob a
hipótese de que será somente assim, que o consulente passará a apropriar-se do
seu adoecer, a responsabilizar-se por suas escolhas e por buscar caminhos que
lhes traga o restabelecimento e equilíbrio organísmico.
Perls (2002), ao referir-se as inúmeras formas e possibilidades de
apropriação da vida assumidas pelo homem, convoca-nos a refletir descrevendo o
seguinte trecho:
É essencial que o homem aprenda a “sensação de si
mesmo”, restaurando todos os impulsos e as necessidades, todos os prazeres e as
dores, todas as emoções e sensações que fazem a vida valer a pena ser vivida,
que se tornaram fundo ou foram reprimidas em nome do seu ideal dourado. Deve
aprender a fazer outros contatos na vida além de suas relações comerciais (p.152).
É pensando em mediar este contato do paciente consigo mesmo e com os
profissionais da saúde, que o psicólogo hospitalar (profissional capacitado
para analisar as relações inter-pessoais), deve esforçar-se para: focar seu
trabalho no paciente, resgatar sua essência de vida interrompida pela doença e
a internação, acolher a demanda do paciente e familiar, considerar o ser humano
em sua totalidade e integralidade, observar e ouvir com paciência e empatia a
linguagem verbal e não-verbal dos pacientes, observar todos os aspectos relacionados
ao adoecer, aumentar a integração da equipe com o usuário, favorecer apoio à
equipe de saúde e familiares, buscar uma visão ampla do que é e como está o
paciente frente ao processo de doença e por fim resgatar a visão de individuo
como um todo.
CONCLUSÃO
Concluímos então, que na atuação do psicólogo hospitalar não basta apenas
ter um vasto conhecimento cientifico é preciso saber como utilizá-lo, lembrando
ainda que, se não estivermos preparados
para aprender com o paciente, nosso saber de nada adiantará. Iludisse o
acadêmico, achando que a simples formação lhe garantirá o sucesso do seu
exercício (afirma Angerami Camon), e o filme: Um golpe do destino, deixa bem
claro a insuficiência do modelo biomédico. Ressalta-se aqui, a importância de se consolidar práticas empáticas e
humanizadas no acolhimento ao paciente enfermo, independente de qual seja o
projeto político de saúde em que é assistido.
REFERÊNCIAS:
PERLS, Frederick S. Egos, fome e agressão: uma revisão da
teoria e do método de Freud. São Paulo. Ed. Summus, 2002.
CARVALHO, Denis Barros de,
SANTANA, Janaína Macêdo & SANTANA, Vera Macêdo de. Humanização e Controle Social: O Psicólogo como Ouvidor Hospitalar.
Revista PSICOLOGIA CIÊNCIA E PROFISSÃO, 2009, 29 (1), 172-183.
MINISTÉRIO DA SAÚDE – SECRETARIA
NACIONAL DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE. ABC do
SUS: Doutrinas e Princípios, Brasília/ DF, 1990.
CAMOM, Valdemar Augusto Angerami
(Org). E a psicologia entrou no hospital.
1ª ed. São Paulo. ED. Pioneira Thomson Learning, 2003.
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